A habilidade para fazer várias coisas ao mesmo tempo vinha sendo enaltecida como uma característica bem-vinda nos profissionais do século 21.
Até que veio a pandemia para exigir das pessoas que apliquem o velho e bom foco como estratégia para tentar dar alguma ordem e lógica ao mundo caótico em que estamos vivendo – tanto do lado de fora quanto dentro de casa, onde trabalho e atividades domésticas passaram a se fundir no cotidiano.
Nesse processo, muita gente se deu conta que está com grandes dificuldades de concentração. Certamente ficou bem mais difícil, nos últimos anos, realizar uma tarefa do começo ao fim, sem desvios. É um desafio ainda maior para os mais jovens, que já cresceram acostumados a ter a atenção diluída.
Hábitos domados
A capacidade de ter foco é essencial não apenas quando estamos diante de uma tarefa muito importante ou urgente, mas também para organizar melhor o nosso dia com o objetivo de torná-lo mais produtivo.
A principal fonte de dispersão, para a maioria das pessoas, tem sido a compulsão de checar e-mails, aplicativos de mensagens e redes sociais. Basta encontrar uma postagem ou notícia que chamou a atenção, ou uma mensagem que precisa de resposta, e pronto: lá se foi o foco naquilo que estava sendo feito até então.
Charles Duhigg, autor do best-seller O Poder do Hábito, falou sobre o assunto durante sua participação na 20ª edição da HSM Expo Now!, realizada em meados de novembro. Ele definiu foco como a visualização daquilo que deve acontecer e também como uma forma de criar desafios para si. “A motivação aumenta quando nos sentimos no controle”, afirmou Duhigg.
A base das teorias do autor é que somos todos comandados pelos nossos hábitos, e entender como esses hábitos funcionam para tentar “domá-los” é a chave para as realizações.
Treinar o cérebro
É claro que a capacidade de foco varia muito de pessoa para pessoa, por conta da educação e de características de personalidade. “Enquanto algumas pessoas organizam-se de forma natural, outras parecem estar condenadas a viver pedindo um tempo extra para concluir seus deveres”, observa Ana Rocha, diretora de Operações da Concentrix, multinacional de soluções de customer experience.
A boa notícia é que nada nesse campo é definitivo. Afinal, se o nosso cérebro está se tornando mais “distraído” por conta dos novos hábitos, também pode ser treinado na direção inversa.
Deve-se, em primeiro lugar, ter consciência de que é impossível realizar simultaneamente duas tarefas que exigem esforço cognitivo. Isso não é ser multitarefa – é ser ausente.
Não é possível participar de uma reunião e responder e-mails no celular ao mesmo tempo, por exemplo. Quando a pessoa presta atenção numa dessas atividades, automaticamente se desliga da outra. No final das contas, a sensação de estar ganhando tempo e “resolvendo problemas” é ilusória.
Realizar mais de uma tarefa ao mesmo tempo só e possível quando juntamos uma tarefa que exige pensamento com outra que pode ser feita no “piloto automático”. Ouvir um podcast enquanto se lava a louça, por exemplo.
Tarefas hierarquizadas
O primeiro grande passo para desenvolver a capacidade de foco é hierarquizar as tarefas que devem ser cumpridas no dia. Quais são as mais importantes e as menos importantes, as mais longas e as mais rápidas, quais os prazos envolvidos. Em outras palavras: estabelecer níveis de relevância.
Essa organização pode ser feita de forma intuitiva, com listas simples, ou com o uso de metodologias desenvolvidas para a gestão do tempo e de tarefas.
Sistematizar esse planejamento ajuda a entender que estar sempre ocupado, resolvendo o maior número de tarefas ao longo do dia, não é sinônimo de produtividade. Ser produtivo é ter a capacidade de dedicar a cada tarefa o nível adequado de esforço e de dedicação.
Foco na missão
Um dos conselhos mais repetidos dos especialistas chega a ser óbvio: dê prioridade ao que é mais importante. As tarefas mais relevantes precisam ser realizadas com 100% de foco – e, de preferência, o quanto antes dentro do dia.
Se você tem um relatório que precisa finalizar e vai demandar três horas de trabalho, programe-se para resolver isso das 9h às 12h, por exemplo.
Não confie que conseguirá ir fazendo o relatório aos poucos, ao longo do dia, em meio às outras tarefas. Mesmo que você consiga, certamente terá investido mais esforço e mais tempo que o necessário, pois cada parada exige que você “entre” novamente na missão.
Balanço saudável
Tarefas mais rápidas do cotidiano, como fazer uma ligação, preparar um bolo, fazer uma aula online ou colocar a roupa para lavar, podem ser inseridas entre as tarefas maiores, funcionando assim como “descansos”.
A mesma lógica deve ser aplicada à compulsão de checar mensagens e redes sociais a todo momento. Desenvolva a mentalidade de fazer isso nos intervalos entre as tarefas, como uma espécie de “prêmio” por tê-las realizado.
O foco ajuda, também, a limitar as horas dedicadas ao trabalho e organizar, assim, o balanço necessário para uma vida mais saudável e equilibrada. Se você estabelecer que só vai começar o expediente às 10h, ou que vai parar durante duas horas no almoço, ou que não vai passar das 19h trabalhando, as tarefas do dia precisarão caber no tempo disponível.
Tudo isso envolve também aspectos emocionais. A pessoa que é procrastinadora contumaz – aquela que vai sempre deixando as tarefas para depois, até chegar no limite do tempo e da tensão – está praticando autossabotagem, possivelmente por razões inconscientes. Lidar com essa questão pode exigir apoio psicológico.
Imagem profissional
A capacidade de foco é, ainda, um atributo essencial na construção da imagem de um profissional. Há uma relação muito próxima entre foco e pontualidade, por exemplo. Quem se dispersa ao longo do dia tende a não cumprir os horários. E quem não cumpre os horários passa a mensagem de falta de confiabilidade.
“A pontualidade faz com que sua imagem profissional pareça polida e organizada, em vez de apressada e aleatória. Não ser pontual com seus compromissos de uma maneira geral é um gravíssimo erro de marketing”, adverte Lucas Atanazio Vetorasso, CEO do Grupo Atnzo, maior holding de franquias do país.
Para Vetorasso, a pontualidade é um grande indício de que o profissional consegue focar naquilo que precisa. “As pessoas não escolhem apenas fazer negócios com quem elas gostam, conhecem e confiam”, diz o executivo. “Elas também gostam de fazer negócios com pessoas que estão no controle. Quem chega sempre cedo ou pontualmente aos compromissos dá a impressão de que gerencia as coisas bem.”
Produtividade e saúde
De acordo com um estudo recente da HSM University sobre o mercado de trabalho no pós-pandemia, a capacidade de planejamento do tempo e de organização das prioridades será o ponto crucial para os profissionais, tanto em home office quanto no ambiente corporativo.
Isso porque, cada vez mais, o desempenho será avaliado pelas entregas realizadas, e não pelo tempo dedicado ao trabalho.
O crescimento do trabalho freelancer é outro fenômeno que impõe a maior necessidade de foco. Para honrar os compromissos com os diversos clientes com os quais lida simultaneamente, o profissional não pode se perder em distrações ao longo do dia.
O estudo destaca três atributos que serão essenciais para o trabalho no pós-pandemia: inteligência emocional, facilidade de adaptação e resiliência.
“Essas três capacidades se complementam”, diz o coordenador e supervisor acadêmico da HSM University, Paulo Lira. “Não só ajudam a manter o foco, mas também a aumentar a produtividade, melhorar o relacionamento com a equipe e evitar que o estresse prejudique a saúde.”
Fonte: Site 6minutos